terça-feira, 29 de janeiro de 2013
Neon
Eu estava vagando sozinho pela noite na cidade e sem perspectiva de me divertir. Um boteco sujo, uma garrafa de gim vagabundo e um blues qualquer na vitrola. Era minha esmola de felicidade naquela noite.
Quando a lua nasce todas as dores se jogam distorcidas nas nossas caras como num teatro de sombras e suas pernas já estão bambas o bastante para que você suporte tudo sem um trago. Um gole que desce quente garganta abaixo, a fumaça do cigarro saindo pelas narinas e você já não está ali por um centésimo de segundo. Quero multiplicar essa sensação até o infinito. Amanhã será só mais um dia de ressaca e o sol estará brilhando e rindo de mim e dos erros que cometi ainda antes dele nascer. Mas ainda consigo trabalhar como se nada tivesse acontecido, distribuindo sorrisos de cera para os colegas que nem desconfiam que tudo o que eu mais queria era chorar no fundo de uma piscina de azulejos brancos com água bastante clorada.
A madrugada vai chegar e eu estarei aqui sentado ouvindo B.B King solando Lucille com firmeza e afeto, como um dia meus dedos percorreram o corpo dela.
You know I tried to be
The man you wanted me to be
But whatever I do, baby
It seems to add to your misery
Oh you can do
What you want to, baby
But you are still my woman
Queria calar a boca e ir dormir mas a minha visão começa a ficar turva e estou inebriado pela bebida. As luzes de neon que piscam lá no final da avenida são um deleite em forma de caleidoscópio. Uma explosão nuclear que banha meu rosto em tons de laranja, cinza e púrpura. Perscrutando por um campo de batalha onde não sairá um vencedor e onde não há glória. No começo dela não há uma doce amante acenando com um lenço branco e em seu extremo oposto há apenas um abismo e nenhum abraço de boas-vindas. A garçonete me serve outra garrafa e percebo que ela está com muito sono. São duas da madrugada. Ela tem cabelos negros e cortados na altura do pescoço alvo e longo. Bêbado demais para soltar um gracejo qualquer. Não há nada mais sincero do que homem embriagado metido a galanteador pois elas sabem que não podem esperar muito mas desta vez eu deixei passar.
O álcool fala alto quando tudo o que você tem é uma vida e nada para preenchê-la. O que havia de real se esvai de suas mãos rapidamente e se incinera como uma estrela cadente bem em frente dos seus olhos. Uma simples queda para perder todo o seu sangue e você é só uma casca oca que o vento pode esmigalhar em poucos segundos. Um espaço escavado em seu peito e vazio te faz tão mal que chega a ser menos horrível a ideia de injetar dor nele. Pelo menos você está vivo. A dor é a nascente do sangue em suas veias e de manhã pode-se pensar em encontrar uma maneira de fazê-lo correr entre elas como outrora. Às vezes tudo o que precisamos é de algo frívolo como o nascer do sol.
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